Pedro Gastão Mesnier

Mesnier, Pedro Gastão (Porto, 23 Setembro 1846 – Lisboa, 1884), figura pouco estudada, foi um dos primeiros portugueses a testemunhar as mudanças operadas no Japão com a reabertura do país à modernidade ocidental. Irmão mais velho do engenheiro Raul Mesnier, iniciou os seus estudos no Instituto Bracarense, fundado em 1859 por seu pai Jacques-Robert Mesnier, um industrial francês, e sua mãe Marie Elodie de Ponsard. Adolescente ainda, Mesnier participou na Exposição Industrial Portuense de 1862, obtendo uma menção honrosa pelo seu expositor. Após uma curta estadia em Newcastle para tentar a carreira comercial, regressou a Portugal e fixou-se em Lisboa, onde integrou a redação da Gazeta de Portugal, fundada por António Augusto Teixeira de Vasconcelos. Entre 1864 e 1870, matriculou-se na Universidade de Coimbra e terá sido acolhido pela família Silva Gaio, sem, porém, concluir qualquer curso.

Com a nomeação em 1870 do visconde de S. Januário, que viria a ser o primeiro presidente da Sociedade de Geografia de Lisboa (SGL), como governador-geral da Índia, Mesnier entra ao seu serviço – e do governo português – na qualidade de condutor das obras públicas em Goa. Documentou sob a forma cronística a viagem, que acompanhou, do visconde ao norte da Índia, Viagem de Sua Exa. o Sr. Visconde de Sam Januario ás Praças do Norte: Bombaim, Damão, Diu, Praganã e Surrate (Imprensa Nacional de Nova-Goa, 1871). Ali ter-se-á também dedicado ao magistério da Física e da Química na Escola Matemática e Militar de Goa.

Em 1872, o visconde é nomeado governador de Macau e Timor, cargo que ocupa até 1874 e acumula com o de ministro plenipotenciário junto das cortes da China, Japão e Sião, mantendo Mesnier como seu ajudante-de-campo (secretário particular). Em Macau, Mesnier lecionaria Ciências e Física no Seminário de S. José, ao mesmo tempo que estudava a língua chinesa com o sinólogo e tradutor-intérprete Eduardo Marques. Mesnier terá tido uma vida social ativa e dado livre curso à educação musical que recebera da mãe, animando festas e serões. Foi, durante este período, o redator principal da Gazeta de Macau e Timor, um semanário político, literário e noticioso que funcionou de 20 de setembro de 1872 a 20 de março de 1874.

Encontramo-lo em novembro de 1873 no Japão como secretário da legação portuguesa por ocasião de uma audiência do visconde com o imperador do Japão, a fim de dinamizar as relações comerciais entre Portugal e este império asiático. Desta embaixada, que lhe permitiu viajar pelo Japão e conhecer os seus lugares mais emblemáticos, resultou o seu trabalho mais conhecido, O Japão. Estudos e impressões de viagem. Impresso em Macau em 1874, pela tipografia que no mesmo ano assegurara a publicação do seu livro de poemas Idyllio, a Typographia Mercantil, O Japão é dedicado ao visconde. Neste ensaio, a par do enlevo pelos costumes, paisagens e folclore japoneses, alinha-se, como mostrou Jorge Dias, com os partidários das teorias racistas e de superioridade ocidental, conquanto reconheça o avanço económico, comercial e industrial daquela nação. Este seu livro não colheu, porém, o louvor de Wenceslau de Moraes que, numa missiva de 29 de novembro de 1904, diz que “a meu vêr não merece nenhum [crédito] (entre nós)”. Opinião contrária terá sido a de Antero de Quental, a quem se atribui a autoria de uma recensão elogiosa publicada na Revista Occidental (31.05.1875). Neste ano terá mesmo saído a tradução inglesa do ensaio em The China Review (Hong Kong). O ano de 1874 fora, porém, trágico para Macau, que a 22 de setembro se vira assolado por um tufão. Mesnier documentou-o no Boletim Oficial da Província de Macau e Timor. O auxílio prestado durante a catástrofe ter-lhe-á valido uma medalha de prata por mérito, filantropia e generosidade.

De volta a Lisboa desde 1875, Mesnier torna-se sócio da SGL – primeiro como correspondente (n.º 35) em 1876, passando em novembro de 1880 a sócio ordinário (n.º 451). Em 1876, redige o artigo “A conquista do Yunnan” para a revista literária A Harpa (série II, n.º 6, pp. 78-79). Em 1878, o visconde de S. Januário expõe na sua casa, na rua do Alecrim, uma coleção de peças de arte reunida aquando da estadia na Ásia; Mesnier ajuda-o a produzir o catálogo da exposição, cuja introdução assina (Catalogue des objets d’art des Indes, de la Chine, du Japon et du Siam, 1877). Uma “Breve noticia historica” da Revista Mensal da Secção da Sociedade de Geographia de Lisboa, no Brazil (tomo I, 1881) coloca Mesnier, a 18 de julho de 1878, no Rio de Janeiro a secretariar o visconde, que estava em missão diplomática junto das repúblicas sul-americanas. A visita motivou uma reunião com os sócios correspondentes da SGL residentes no Rio de Janeiro, daí resultando a criação da filial brasileira da SGL. Foi durante esta viagem que Mesnier adoeceu gravemente, ficando retido nos Andes por dois meses. As sequelas deixadas pela doença vitimá-lo-iam ainda jovem.

Por ocasião do tricentenário da morte de Camões, em 1880, o polígrafo publica o opúsculo A Odyssea Camoneana: romagem aos principaes logares que a estada de Luiz de Camões deixou assignalados, decorrente de uma conferência dada no Salão da Trindade, em Lisboa, onde, cinco anos antes, palestrara sobre geografia e antropologia. Ainda em 1875, assinaria o primeiro fascículo de Agentes de transformação e classificação das raças humanas com o seu Ensaio de philosophia anthropologica, no qual infere a respeito da ação do homem sobre o homem como motor de transformação e distribuição morfológica das raças humanas. Discursou na sessão inaugural do Club Académico do Porto no início de 1881; as palavras então proferidas foram transcritas na revista de ciências e letras Pantheon (n.º 7). Colaborou no Jornal de Domingo, dirigido por Pinheiro Chagas (n.º 5, 20.03.1881, pp. 36-38), e em 1882 vê dadas à estampa as suas Considerações ácerca do Tratado de Lourenço Marques.

A obra de Mesnier serviu de fonte a Bento da França para o seu Subsidios para a Historia de Macau (1888), a António Campos Júnior para A Estrella de Nagasaki, a O Japão por Dentro (1906) de Ladislau Batalha e ao Glossário Luso-Asiático (1919) de Sebastião Rodolfo Dalgado. Sampaio Bruno dedica-lhe algumas páginas em Portuenses Illustres (volume III, 1908).

MPP

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Bibliografia

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[Comércio do Porto] (1862), O Commercio do Porto, 12 abril, https://arquivo.cm-gaia.pt/objects/cmg%3A151256/full/OComrciodoPortoAnoIXn8512deAbrilde1862.pdf.

Dias, Jorge (1994), “Uma perspectiva benévola do Japão da Era de Meiji: Mesnier e o culto do Niponismo”, No Ádito da Ásia: episódios da aventura portuguesa no Oriente, Macau, Instituto Português do Oriente, pp. 55-63.

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