Gabriel de Magalhães

MAGALHÃES, Gabriel de (1609/1610, Pedrógão Grande – 1677, Pequim), missionário jesuíta na China, escritor, artífice. Filho de Manuel Calvo de Magalhães e de Maria de Andrade Leitão, Gabriel de Magalhães nasceu em Pedrógão Grande (Leiria), onde estudou até à adolescência com um tio cónego. Já entrara na Universidade de Coimbra, quando, em 1625, com 16 anos, foi admitido na Companhia de Jesus. Autorizado pelos seus superiores a tornar-se missionário na Ásia Oriental, embarcou em Lisboa, em Março de 1634, nas naus da Carreira da Índia, rumo a Goa. Foi nesta cidade que foi ordenado sacerdote, antes de prosseguir viagem, em Abril de 1637, para Macau, onde apenas terá chegado já em 1639, após uma escala mais demorada em Malaca. Designado para a missão da China, aí entrou em 1640, com o nome chinês An Wensi 安文思. Instalou-se então na cidade de Hangzhou (província de Zhejiang), na qual deu início ao estudo do chinês tendo por mestre o irmão jesuíta sino-javanês Manuel Gomes (1608–1648/1649). Decorridos dois anos, foi juntar-se a Ludovico Buglio (1606–1682), superior da residência jesuíta de Chengdu (província de Sichuan). Quando a cidade foi tomada pelo poderoso líder rebelde Zhang Xianzhong 張獻忠 (1601–1647), em meados de 1644, os dois jesuítas entraram ao seu serviço devido aos conhecimentos astronómicos. Porém, no início de 1647, com a derrota de Zhang frente à nova dinastia manchu, Gabriel de Magalhães foi conduzido a Pequim sob prisão, juntamente com Buglio. Através da intervenção de Adam Schall von Bell (1592–1666), então ao serviço do imperador Shunzhi (r. 1644–1661) no Departamento Astronómico Qintianjian 欽天監, Magalhães acabou por ser libertado. Permaneceria em Pequim até ao final da vida, trinta anos mais tarde, tendo sempre Buglio por companheiro.

Assinatura de Gabriel de Magalhães

Magalhães veio a sobressair pelo seu talento ao nível da mecânica. Designando-se a si próprio como o “serralheiro”, esteve à frente da botica ou oficina jesuíta em Pequim, depois herdada por Tomás Pereira (1646–1708). Ali construiu autómatos e relógios, dos quais sobreviveram interessantes descrições.

Entre a sua produção textual em língua europeia, ganha relevo a obra Doze Excelências da China, concluída em 1668. O manuscrito em português seguiu, já em 1682, para a Europa com o procurador da vice-província da China, Philippe Couplet (1622–1693). O seu editor foi o abade francês Claude Bernou que, confrontado com um manuscrito muito danificado tentou recuperá-lo, ao mesmo tempo que o reorganizou e introduziu alterações, desdobrando-o em mais capítulos e incluindo um pequeno relato biográfico de Magalhães da autoria de Buglio. O livro veio a ser editado em Paris, em 1688, com o título Nouvelle Relation de la Chine. Seguiram-se outras edições, nomeadamente em língua inglesa, ainda no mesmo ano. Apenas em meados do século XX, surgiu uma versão portuguesa, preparada por Luís Gonzaga Gomes a partir da edição francesa (Macau, 1957). Gabriel de Magalhães foi, ainda, autor de um “Tratado das Letras e Língua Chinesa”, composto para os novos missionários que, infelizmente, se perdeu. Sobreviveram, porém, várias cartas manuscritas de Magalhães, algumas das quais publicadas por Irene Pih. Em língua chinesa, refira-se a obra Fuhuo Lun 復活論 (Pequim, 1677/1678) [Livro da Ressurreição dos Corpos], enquadrado no projecto de tradução da Summa Theologiae de S. Tomás de Aquino, empreendido por Buglio, entre 1654 e 1678.

Folha de rosto da primeira edição de Nouvelle Relation de la Chine (Paris, 1688)

Nouvelle Relation de la Chine, capítulo sobre a língua e escrita chinesa, com explicação dos caracteres

IMP

BIB: MUNGELLO, D.E. (1985), pp. 91-105; O’NEIL, C.E. e DOMÍNGUEZ, J.M. (2001), p. 2468; PIH, I. (1979); STANDAERT, N. (2001); ZÜRCHER, E. (2002); Chinese Christian Texts Database – KU Leuven;

REFERÊNCIAS COMPLETAS (OBRAS AINDA NÃO REFERENCIADAS NA BIBLIOGRAFIA DO PROJECTO)

O’NEIL, Charles E. e DOMÍNGUEZ, Joaquín Mª, eds. (2001), Diccionario Histórico de la Compañia de Jesús, 4 Vols. Roma-Madrid, Institutum Historicum-Universidad Pontificia Comillas.

PIH, Irene (1979), Le Pere Gabriel de Magalhães, un jesuite portugais en Chine au septieme siècle, Paris, Fundação Calouste Gulbenkian-Centro Cultural Português.

STANDAERT, Nicolas, ed. (2001), Handbook of Christianity in China, Volume One: 635–1800, Brill, Leiden-Boston-Colónia.

ZÜRCHER, Erik (2002), “In the Yellow Tiger’s Den. Buglio and Magalhães at the court of Zhang Xianzhong, 1644–1647”, Monumenta Serica 50, pp. 355-374.