Adeodato Barreto

BARRETO, Júlio Francisco António Adeodato (1905, Margão – 1937, Coimbra) foi poeta, escritor, educador, jurista e notário. Foi uma das personalidades goesas que mais se destacou no campo da poesia em língua portuguesa, tendo sido o primeiro poeta goês a abandonar a forma do soneto e a privilegiar o verso livre. Instalou-se em Portugal a partir de 1922. Licenciou-se pela Faculdade de Direito (1928) e pela Faculdade de Letras (1929) da Universidade de Coimbra, cidade onde fundou o Instituto Indiano, as Edições Swatwa e Índia Nova: jornal da expansão da cultura indiana (1928-1929), junto com Telo de Mascarenhas e José Teles. De acordo com Sandra Lobo (2009), a ideia de fundar o Instituto Indiano no seio da Universidade de Coimbra conjugava a necessidade de começar, no nível académico, uma tradição de estudos indianos em Portugal, com uma chamada de responsabilidades aos portugueses para finalmente cumprirem o seu dever de promover o conhecimento das culturas dos povos atingidos pelo projeto de expansão colonial e, portanto, favorecer a cooperação entre estes. A atividade do Instituto Indiano marcou profundamente uma geração de jovens intelectuais goeses enraizados na metrópole e, em simultâneo, de jovens intelectuais portugueses que se aproximavam, naquela altura, do estudo das culturas indianas, numa ótica que transcendia a investigação científica de cariz colonialista. Como reportam Vimala Devi e Manuel de Seabra, o jornal Índia Nova, o qual surgiu a partir da experiência do Instituto Indiano, contou com a colaboração de numerosos goeses, entre os quais se destacam Santana Rodrigues, Santa Rita e Sousa, Mário da Silva Coelho, Maria Ermelinda dos Stuarts Gomes, Luís Timóteo de Sousa e Luís Colaço, tendo abordado, ao longo dos seus números, diferentes temas e problemas, entre os quais o nacionalismo indiano e o ensino das línguas vernáculas em Goa.

Adeodato Barreto dedicou a sua breve vida à revitalização de uma consciência indiana entre os goeses, por meio do trabalho de tradução e divulgação das obras clássicas da filosofia hindu e da literatura em sânscrito, tendo sido influenciado pelo pensamento nacionalista de Rabindranath Tagore, com o qual manteve correspondência, e pelos trabalhos dos orientalistas franceses Silvain Lévi e Romain Rolland. Deste último, traduziu para o português, em 1925, a sua obra sobre Gandhi, tradução que não chegou a ser publicada. A ideia de civilização encontra-se no centro da produção intelectual tanto de Adeodato Barreto quanto do próprio grupo de Coimbra. O seu ensaio Civilização Hindu: autodomínio, tolerância, humanismo e síntese de 1935, compilado a partir de uma série de artigos publicados na revista Seara Nova, é representativo de uma conceção universalista e não imperialista do mundo, a qual reconhece ao legado cultural indiano o potencial didascálico necessário para guiar os povos em direção a uma nova época de paz e harmonia.

Depois das experiências em Coimbra, Adeodato Barreto mudou-se para o Alentejo, onde trabalhou como professor no Liceu de Évora, e a seguir como notário em Montemor-o-Novo, onde fundou o periódico O Círculo (1934), envolvendo-se nos circuitos culturais e sociais de oposição ao Estado Novo. Encontram-se publicados o já citado ensaio Civilização Hindu (1935) e o livro póstumo de poesias O Livro da Vida: cânticos indianos (1940), o qual contém um poema em língua concani, “Bekaryanc”.

Bibl: DEVI&SEABRA (1971); COSTA (2000); SANTOS (2000); LOBO (2009).

D. S.

Referências bibliográficas completas

COSTA, Orlando da (2000), “Indianidade, Solidariedade, Liberdade” in Civilização Hindu seguido de O Livro da Vida, Lisboa, Hugin, pp. 5-10.

DEVI, Vimala. SEABRA, Manuel de (1971), A Literatura Indo-Portuguesa, Lisboa, Junta das Investigações do Ultramar.

LOBO, Sandra Ataíde (2009), “Índia Nova: nacionalismo e cosmopolistismo num jornal académico”. Cultura. Revista de História e Teoria das Ideias, 26, pp. 231-258.SANTOS, Elsa Rodrigues dos (2000), “Alguns Dados Biográficos” in Civilização Hindu seguido de O Livro da Vida, Lisboa, Hugin, pp. 11-17.