Tomás Pereira

Pereira, Tomás (1646, S. Martinho do Vale/Braga-1708, Pequim), missionário jesuíta na China, músico, artífice, presidente-interino do Departamento Astronómico de Pequim, conselheiro político/diplomático  

Originário de uma família da nobreza rural, figura no registo de baptismo como Santos. Tendo estudado em Braga e Coimbra, foi nesta última cidade contemporâneo do padre António Vieira (1608-1697) e, também, do primeiro padre jesuíta chinês, Manuel de Sequeira/Zheng Weixin (1633-1673). Ao ingressar na Companhia de Jesus, em 1663, tomou o nome de Tomás, pelo qual ficou conhecido.

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Registo de baptismo de Tomás Pereira (“Sanctos”), 5/11/1646 (Arquivo Distrital de Braga)

Em 1666, partiu para Goa, onde prosseguiu os seus estudos e foi ordenado padre, em 1671. Neste mesmo ano, embarcou para Macau, sendo depois designado para a missão da China. Devido aos seus dotes musicais, foi estrategicamente colocado em Pequim, após ter sido recomendado ao imperador chinês Kangxi (1662-1722), pelo superior da missão, Ferdinand Verbiest (1623-1688). Chegado à capital Qing nos primeiros dias de 1673, aos 26 anos de idade, ali viveu nos 36 anos que se seguiram, sempre sob o mesmo imperador. Tendo adoptado o nome de Xu Risheng/徐日昇, deu desde logo início à aprendizagem da língua chinesa e foi, ao longo do tempo, adquirindo um elevado domínio daquela, assim como da cultura chinesa, através do estudo e da larga vivência na Corte Imperial.

Os seus conhecimentos musicais, a par da sua habilidade manual contribuíram decisivamente para alcançar uma posição de destaque na Corte Qing, pouco comum para um europeu. A sua aproximação a Kangxi remonta ao início da década de 1680, período em que lhe deu aulas de música europeia, assim como a alguns dos príncipes imperiais. Nesse âmbito, compôs um tratado, Lulu zuanyao (Elementos de Música), considerado o primeiro de música europeia em chinês. Para ensinar e falar de música a Kangxi, Pereira acompanhou-o por duas vezes nas suas viagens à Tartária (Manchúria, 1685; e Mongólia, 1696).  Enquanto “artífice”, como se auto-intitulava, projectou e construiu um vasto conjunto de instrumentos musicais (sobretudo orgãos e sinos), relógios e outros engenhos mecânicos, vários dos quais oferecidos ao imperador e a outros altos dignitários da Corte. Foi ainda escolhido para reparar os relógios da colecção imperial.

No final da década de 1680, desempenhou um relevante papel nas relações diplomáticas entre a China e a Rússia como tradutor e conselheiro político/diplomático, da delegação imperial chinesa que se dirigiu a Nerchinsk (Sibéria), para negociar a delimitação das fronteiras com os russos, e de que resultou a assinatura, em 1689, do primeiro tratado de paz sino-russo (Tratado de Nerchinsk). Estas negociações foram registadas por Pereira, num longo relato, escrito em 1690, após o seu regresso a Pequim.

Entre 1688 e 1694, assumiu a presidência, a título interino, do Departamento Astronómico (Qintianjian) de Pequim, cargo predominantemente ocupado pelos jesuítas, desde o início da dinastia Qing.

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Carta de Tomás Pereira a Giovanni Filippo de Marini, Pequim, 20/8/1678 (Archivum Romanum Societatis Iesu, Jap.Sin. 124, fl. 149)

O lugar que foi alcançando junto de Kangxi traduziu-se na atribuição de todo um conjunto de honras e benesses, por meio das quais o imperador o foi distinguindo e reconhecendo os seus serviços. De entre estas, sobressai o chamado Édito de Tolerância em favor da religião cristã, promulgado em 1692 e posteriormente gravado na sua lápide funerária. A imagem de servidor leal e de homem de virtude ficaria plasmada numa compilação de ensinamentos dirigida por Kangxi aos príncipes imperiais (Shengzu Ren huangdi tingxun geyan 聖祖仁皇帝庭訓格言).

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Assinatura de Tomás Pereira

Destes 36 anos em que viveu em Pequim, saliente-se a sua larga produção textual, de que se conservam 151 cartas e 10 relatos e tratados, que atestam a dimensão dos seus conhecimentos sobre a China Qing, o império em que viveu mais de metade da sua vida. Um dos tratados mais relevantes, por ter sido o primeiro sobre o tema da autoria de um europeu, é o que dedicou ao Budismo chinês. Este sobreviveu apenas por via indirecta, integrado literalmente na obra do também jesuíta Fernão Queirós, Conquista espiritual e temporal de Ceilão (c. 1687-1688). O tratado destaca-se da anterior produção jesuíta sobre o Budismo por ter tido directamente por base uma obra chinesa sobre a vida de Buda, que foi traduzida, sumariada e comentada.

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Tratado do Budismo Sínico, s.l. (anterior a 1688) (Biblioteca Nacional do Brasil, Rio de Janeiro)

C.C.G. & I.M.P.

Bibl.: BARRETO, ed. (2010); GOMES & PINA (2016), pp. 6-16; PEREIRA (2011); SARAIVA, ed. (2013); WARDEGA & SALDANHA (2012)

Manuel Dias Sénior

DIAS Sénior, Manuel (c. 1560, vila de Alpalhão, Nisa/Portalegre – 1639, Macau), missionário jesuíta na China, visitador e reitor do colégio de Macau

Admitido no noviciado da Companhia de Jesus em Évora, em finais do ano de 1575, Manuel Dias, cognominado Sénior (para o distinguir de um outro jesuíta da missão da China, seu homónimo, ligeiramente mais novo) ali concluiu os seus estudos de Filosofia e realizou parte dos de Teologia. Uma década mais tarde, já com 25 anos, embarcou para a Índia, tendo alcançado Goa em 1586. Nesse mesmo ano, ou no seguinte, foi ordenado padre. Permaneceu na Índia sete anos, até que, designado para o Japão, partiu para Macau em 1593, aos 33 anos. A estadia foi, no entanto, breve, pois no ano seguinte já estava de regresso à Índia, como companheiro de Alessandro Valignano (1539-1606), o visitador das Índias Orientais. Novamente em Macau, ocupou, entre 1597 e 1601, o cargo de reitor do colégio jesuíta da Madre de Deus. Seguiu-se a entrada na missão da China, altura em que adoptou o nome Li Manuo 李瑪諾. Aí, entre 1603 e 1609 foi reitor das residências jesuítas do Sul (Shaozhou, Nanchang e Nanquim), subordinado ao superior da missão, Matteo Ricci (1552-1610). Voltou depois a Macau, onde se manteve por mais de dez anos. Nesse período, desempenhou, pela segunda vez, entre 1611 e 1615, o cargo de reitor do Colégio jesuíta. Em 1622, foi escolhido para visitador da missão da China, dando início a uma viagem de inspecção, concluída em 1624. Parece ter continuado na China continental até 1629, quando, já muito afectado pela surdez, o visitador André Palmeiro (1569-1635) decidiu que passasse a Macau. Em 1635, por ocasião da morte deste visitador, Dias foi escolhido para o suceder, mantendo-se em funções até pouco antes de falecer, naquela cidade, em 1639, no meio de um aceso conflito com os missionários do Japão que o depuseram. Encontrava-se então à beira dos 80 anos, metade dos quais passados em Macau (c. 25 anos) e na China continental (16 anos).

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Assinatura de Manuel Dias Sénior numa carta de 1597.
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Relato do naufrágio da nau Santiago, a bordo da qual Manuel Dias iniciou a viagem para Goa, em 1585 (publicado por Bernardo Gomes de Brito, ed., História Trágico-Marítima, tomo II, Lisboa: Officina da Congregação do Oratório, 1736).

Ao longo deste extenso período, a produção textual de Manuel Dias foi significativa. Com efeito, sobreviveram mais de meia centena de cartas e outros documentos, onde podemos encontrar informação variada sobre a China e Macau. Refira-se quase uma dezena de cartas ânuas (os relatórios anuais enviados para Roma) de sua autoria, quer do colégio da Madre de Deus, quer da missão da China, das quais duas foram publicadas à época (ânuas da China de 1619 e de 1625), em edições italianas (1624 e 1629) e francesas (1625 e 1629).

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Carta ânua da China de 1625, de Manuel Dias. Traduzida de português para italiano, foi publicada em Lettere dell’Ethiopia Dell’Anno 1626. fino al Marzo del 1627 E della Cina Dell’Anno 1625. fino al Febraro del 1626, Roma: Appresso l’Erede di Bartolomeo Zannetti, 1629. O manuscrito original encontra-se na Real Academia de Historia, em Madrid.

Deste corpo documental, afigura-se particularmente interessante, pelo seu carácter pioneiro, uma “Ratio studiorum para os nossos que ham-de estudar as letras e lingua da China”. Datada de 1624, constitui o primeiro plano de estudos de chinês composto por um europeu. Deste documento apenas sobreviveu uma cópia manuscrita do século XVIII, preservada na Biblioteca da Ajuda.

Na elaboração deste plano não terá sido alheia a experiência de Dias no estudo de chinês. Ao que tudo indica, o jesuíta nunca terá dominado a língua, como sucedeu com outros dos seus correligionários da China. Mas, ainda assim, dedicou-se ao seu estudo durante algum tempo, o que lhe permitiu conhecer a estrutura da língua e as dificuldades inerentes à sua aprendizagem. Em 1605, três anos após o seu ingresso na missão, declarava que até então se tinha essencialmente devotado àquele estudo. Três anos mais tarde, com quase 50 anos, asseverava já estar em condições de compreender razoavelmente a língua, apesar da complexidade desta, com tantas e “tão intrincadas letras”, e da sua idade demasiado avançada. Mais atrasado na oralidade, previa que num prazo de dois anos, já estaria em condições de falar de forma a que os chineses o entendessem. Porém, assim não terá sucedido, pois em 1623, continuava a queixar-se da sua “falta de lingoa”.

Seja como for, no ano seguinte, após consultar sobre o tema os membros mais experientes da missão da China, durante a sua visita àquela, Dias redigiu um conjunto de directrizes para o estudo do chinês. Destinado aos missionários europeus e estudantes de Macau, pretendia-se que assim pudessem levar a cabo a aprendizagem “com mais proveyto e menos trabalho que ate agora”. Tinham, até então, decorrido cerca de 40 anos de estudo sistemático da língua por parte dos jesuítas daquela missão.

Nesta Ratio Studiorum, que pelo menos durante algum tempo parece ter sido efectivamente posta em prática, é clara a síntese entre os métodos jesuíta e chinês de ensino. Com efeito, tendo por base, como o próprio nome indica, a Ratio Studiorum que regulamentava os estudos nos colégios da Companhia de Jesus, juntavam-se todo um conjunto de determinações fundadas nas práticas chinesas de ensino. O plano compreendia três fases de aprendizagem ao longo de quatro anos: uma primeira, de introdução à oralidade e caracteres; uma segunda  de iniciação na leitura e de análise dos textos confucianos (Quatro Livros/Sishu), sob a orientação de um mestre que ensinasse em português; e uma última, que incluía a revisão sistemática das matérias já abordadas, mas com um mestre chinês, capaz de clarificar e aprofundar os conhecimentos adquiridos.

Se este plano se pode destacar entre os textos de Dias Sénior, evidentemente o seu conhecimento sobre a China Ming, foi bastante mais abrangente, como fica perfeitamente patente na documentação que chegou até nós.

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“Ratio Studiorum”, composta por Manuel Dias Sénior, em 1624 (Biblioteca da Ajuda, Jesuítas na Ásia 49-V-7, fls. 310v-315).

IMP

Bibl.: BROCKEY, L. M. (2007), pp. 255-268; COSTA, J.P. Oliveira e PINTO, A. Fernandes (1999); SEBES, J. (2001), pp. 1112-1113; PFISTER, L. (1976), p. 74; PINA, I. Murta (2008), pp. 79-94; TEIXEIRA, M. (1972), p. 149.

Manuel Augusto Rodrigues

RODRIGUES, Manuel Augusto, (1936, Espinheiro – 2016, Pampilhosa), professor catedrático jubilado da Universidade de Coimbra, Director do Arquivo da Universidade de Coimbra (1980-2003), hebraísta e arabista.

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Fotografia, anos 1990

Formado em Teologia e Ciências Bíblicas pela Pontifícia Universidade Gregoriana em Roma e em Línguas Semíticas pelo Pontifício Instituto Bíblico de Roma, nos anos 1955-1962, prosseguiu os seus estudos na École Biblique et d’Archéologie Française, em Jerusalém (1962-1963).
Em 1963, foi convidado pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra como professor extraordinário além do quadro para reger a cadeira de História do Cristianismo e, desde então, ligou a sua carreira a esta prestigiada universidade. Doutorou-se em 1975 em História da Cultura Medieval e Moderna com a tese “A Cátedra de Sagrada Escritura na Universidade de Coimbra (1537-1640)”, tendo prestado provas para professor extraordinário em 1978 e para professor catedrático em 1980.
Leccionou diversas disciplinas, entre outras, História da Cultura Moderna, Antiguidade Oriental, História da Península Hispânica, História da Universidade de Coimbra, História das Religiões e Língua e Cultura Hebraicas. Quando em 1965, a cadeira do Árabe foi restaurada na Universidade de Coimbra, foi Manuel Augusto Rodrigues encarregue de a reger, decorrendo as aulas de modo um tanto irregular, condicionadas pelo número de estudantes inscritos.

Fez parte da Comissão Organizadora do IV Congresso da UEAI (L’Union Européenne des Arabisants et Islamisants), acolhido em 1968 em Portugal, cujas sessões tiveram lugar em Coimbra e em Lisboa. Na sua intervenção na sessão de encerramento do referido Congresso (publicada nas Actas (1971), pp. XXIX-XXXV) fez referência à longa tradição de contactos portugueses com o mundo muçulmano, à presença de alguns milhões de Muçulmanos no Ultramar (1964), expressando o desiderato de que desse Congresso nascesse, em Portugal, um maior interesse pelos Estudos Árabes e Orientais e que estes pudessem vir a ocupar um lugar de relevo.  Em 1982, aquando da realização do XI Congresso da UEAI, em Évora, Faro e Silves, Manuel Augusto Rodrigues esteve, de novo, envolvido na sua organização, sendo o Presidente da Comissão Organizadora.

A sua investigação abrangeu a problemática teológica, exegese bíblica, história religiosa, incluindo as questões da inquisição e da reforma protestante, entre outras. Debruçou-se exaustivamente sobre a história da Universidade de Coimbra, tendo sido nomeado Pró-Reitor para as comemorações dos 700 anos da Universidade de Coimbra (1990-1994). Entre a sua vasta obra publicada, destacaremos, no âmbito orientalista, as seguintes publicações: Gramática elementar de hebraico (1967, reed. 1993); “Aspectos da presença árabe no Itinerário da Terra Santa de Fr. Pantaleão de Aveiro” (1971); ”D. Paulo Hodar Presbítero Maronita, Professor de Línguas Orientais na Universidade de Coimbra (1773-1780). Algumas notas sobre Hebraístas e Arabistas Portugueses” (1985); “Os incunábulos hebraicos impressos em Portugal” (1992) e “Os incunábulos hebraicos portugueses e o seu significado histórico-cultural”(1996).

Foi sócio de várias agremiações, entre outros, da Academia Portuguesa da História (1975), da Sociedade de Geografia de Lisboa (2006) e  da Academia das Ciências de Lisboa (2010).

E-M.v.K

Bibl.:

KEMNITZ, E-M. von (1987), p. 33; Idem (2011), p. 126; “Pampilhosa: Professor  Manuel Augusto Rodrigues faleceu aos 80 anos”, Jornal da Bairrada, 16 de Dezembro de 2016; “Faleceu Manuel Augusto Rodrigues, ex-director do Arquivo da UC”, Diário de Coimbra, 17 de Dezembro de 2016.

Suleiman Valy Mamede

VALY MAMEDE, Suleiman, (1937-1995, Lisboa), nascido em Moçambique, jurista de formação, co-fundador e primeiro Presidente da Comunidade Islâmica de Lisboa, jornalista e divulgador da problemática árabe-islâmica em Portugal.

Na então, Metrópole, desde 1960, enquanto membro de um pequeno grupo de estudantes muçulmanos vindos do Ultramar, cedo se apercebeu das dificuldades de ser muçulmano num país católico. Esses problemas só poderiam ser solucionados através da institucionalização deste grupo o que, efectivamente, ocorreu com a criação de Comunidade Islâmica de Lisboa (CIL), de perfil sunita (1968) da qual Suleiman Valy Mamede foi co-fundador e seu primeiro Presidente até 1988. Lançou a revista O Islão, órgão da CIL, em 1968. Esta foi a primeira revista periódica em língua portuguesa dedicada às questões islâmicas, tanto em termos religiosos, como culturais. A CIL desempenhou ainda um papel relevante na integração social e profissional de Muçulmanos vindos do Ultramar na senda da descolonização e no apoio à construção da Mesquita de Lisboa, num terreno cedido pela Câmara Municipal de Lisboa, inaugurada em 1985. Suleiman Valy Mamede foi ainda fundador do Centro Português de Estudos Islâmicos (1988), uma instituição cultural vocacionada para a divulgação e estudo da problemática do Islão.

Como director da ANOP (Agência Noticiosa Portuguesa) e jornalista, Suleiman Valy Mamede teve papel muito importante na divulgação do Islão e da problemática árabe–islâmica junto do publico português, em termos de abordagem pedagógica, versando não só o passado, mas também a complexa actualidade sócio-política.

Foi autor de vários trabalhos: Maomé e o Islamismo (1967a); As fontes do direito muçulmano (1967b); “O XIV Centenário do Alcorão” (1968 a e 1969); Pensamento Islâmico (1968 b); O Islão no Espaço Português (1970a); As Comunidades Muçulmanas de Moçambique (1970b); “O Islão em Portugal na actualidade” (1971); Palestina, drama do nosso tempo (1978); Problemática Árabo-Islâmica. Alguns Estudos (1983); O Islão e o Direito Muçulmano (1994). Publicou ainda uma tradução do Alcorão (1978).

E-M.v.K

 

Bibl.: AMARO MONTEIRO, F. (1989), passim; BERNARDO, L. (2014), pp. 11-13; HERTEL, P. (2012), pp. 137-139, 141; KEMNITZ, E-M. von (1987), pp. 33-34; Idem (2002), pp. 17-18; Idem (2011), p. 126; MACHAQUEIRO M. A. (s/d), passim; Idem (2011), pp. 225-226; Idem (2013), pp. 21, 25-26; “Fundador da Comunidade Islâmica, Sulayman Valy Mamede morre aos 59 anos”, A Capital, 29 de Março de 1995.

José Alberto Ramalho Ortigão [B.O.]

José Alberto Ramalho Ortigão, Engenheiro civil / geotécnica, Doutorado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (1980); Pós-Doutorado pela Building Research Establishment (1984);  pela University of British Columbia (1992) e pela City University of Hong Kong (1997). Professor e investigador da UFRJ, actualmente consultor do Conselho Científico e Tecnológico e consultor da Research Grants Council. Conforme afirma, a sua vida mudou graças à leitura, na sua adolescência, de O Homen que Contava de Malba Tahan.

Júlio César de Mello e Souza

MELLO E SOUZA, Júlio César de (1895, Rio de Janeiro – 1974, Recife), matemático, orientalista e escritor.

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Fotografia de Júlio César de Mello e Souza.

Iniciou os estudos no Colégio Militar, na Tijuca (1906), e depois cursou engenharia civil na Escola Politécnica, no Rio de Janeiro, onde se graduou em 1913, mas nunca exerceu a profissão.

Teve uma carreira de brilhante professor de matemática no Colégio D. Pedro II, chegando a catedrático, tanto no D. Pedro II, como também na Escola Normal, posteriormente Instituto de Educação.

Escreveu um total de 51 livros sobre a disciplina,  sendo um crítico severo da didática tradicional dos cursos de matemática da primeira metade do século XX. Notabilizou-se no uso didático da História da Matemática, na defesa de um ensino baseado na resolução de problemas não-mecânicos e na exploração didática das atividades recreativas e no uso de material concreto no ensino da Matemática. Foi ainda pioneiro a explorar a possibilidade do ensino por rádio e televisão, fazendo programas semanais na Rádio Nacional e, mais tarde, na TV Tupi do Rio e Cultura de São Paulo. Era o único professor de matemática que conseguiu ser famoso como um jogador de futebol.

O dia do seu nascimento, 6 de Maio, é no Brasil o Dia da Matemática.

Após a sua morte a sua biblioteca e documentos foram doados pela família ao Museu Malba Tahan, na cidade de Queluz, no Estado de São Paulo.

Procurando lançar-se como escritor, Mello e Souza resolveu criar uma figura exótica e estrangeira,  Malba Tahan , e passar como tradutor dos contos e livros desse. Adoptou, assim,  o pseudónimo de Malba Tahan, encarnando mesmo a personagem que ele próprio criou. Foi autorizado pelo Presidente Getúlio Vargens a incluir oficialmente Malba Tahan no seu nome (1952).

Ao ler os contos das Mil e Uma Noites, ainda menino, havia se apaixonado pela cultura árabe. Partindo desse conhecimento, e melhorando-o com outras leituras e inclusive com um curso de árabe, construiu seu personagem.

Malba Tahan (1885, nas proximidades de Meca – 1921 ?),  do seu nome completo Ali Yazid Izz-Edim Ibn Salim Hank Malba Tahan. Fez estudos em Istanbul e no Cairo, desempenhou funções de kaymakan ou perfeito da cidade de Medina.

Com 27 anos se tornou detentor de grande herança paterna e passou a viajar pelo mundo.  Esteve no Japão, Rússia e Índia. Malba Tahan faleceu em 1921, no auge de um combate pela independência de uma tribo da Arábia.

Notabilizou-se como autor de O Homem que Calculava (1938), um livro de divulgação de matemática que teve bastante impacto entre jovens, tendo sido também divulgado em numerosas traduções, sendo o valor pedagógico desta obra reconhecido internacionalmente.  Recebeu o Prémio da Academia Brasileira de Letras (1972). O escritor Jorge Luiz Borges colocava-o entre os mais notáveis livros da Humanidade. De certo modo, este tema foi continuado ainda em Matemática Divertida e Curiosa.

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Tradução inglesa de 1993

Este livro, bem como um conto seu Lilavati – Aventuras de Matemática inspiraram peças de teatro.

Malba Tahan, foi autor prolífico, tendo escrito outros livros, vários deles no estilo de contos das Mil e Uma Noites, entre eles: Aventuras do Rei Baribê; A Caixa do Futuro; Céu de Alá;  A Sombra do Arco-Íris; Lendas do Céu e da Terra;  Lendas do Deserto;  Lendas do Oásis; Lendas do Povo de Deus; Maktub; Os Melhores Contos; Meu Anel de Sete Pedras; Mil Histórias Sem Fim (2 volumes); Minha Vida Querida; Novas Lendas Orientais; Salim, o Mágico e Acordaram-me de Madrugada.

B.O.

Bibliografia: BOUCHENY, G. (1939); CALHEIROS, M. T. (1991); FARIA, J. C de (2004);  KARAM, J.T. (2005); MELLO e SOUZA, J.B. de (1949); VILLAMEA, L. (1995).

 

Adel Yussef Sidarus [A.S.]

Adel Yussef Sidarus, nascido no Cairo (Egipto) a 12/10/1941. Estudou Filosofia, Cristianismo Oriental, Egiptologia e Coptologia, Estudos Árabes e Semíticos em vários países do Médio Oriente  e da Europa Ocidental. Doutor em Estudos Orientais pela Universidade de Munique (Alemanha), 1973.

Desde 1976, reside em Portugal.  Professor Jubilado da Universidade de Évora (1977-2008), Investigador convidado do Instituto de Investigação Científica Tropical, Lisboa (1998-2006), e do Institut de Recherche et d’Histoire des Textes, CNRS, Paris (1992/3 e 2007/8. Em 1994, obteve o estatuto de “Professeur des Universités”, em França. Desde 2005 é também professor e investigador convidado do Instituto de Estudos Orientais da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa, Lisboa. Em 2014, ingressou na Academia Ambrosiana, Milão, na Classe de Estudos Africanos.

Filipa Lowndes Vicente [F.L.V.]

Filipa Lowndes Vicente é Doutorada em História pela Universidade de Londres (2000) com uma tese que deu origem ao livro Viagens e Exposições: D. Pedro V na Europa do Século XIX (2003).  É investigadora no Instituto de Ciências Sociais (ICS) da Universidade de Lisboa. Tem trabalhado na área de estudos coloniais e estudos sobre a Ásia. Publicou neste domínio: Outros Orientalismos: a India entre Florença e Bombaim (1860-1900) e Entre Dois Impérios. Viajantes britânicos em Goa (2015). Actualmente, está a preparar José Gerson da Cunha: biografia intelectual de um goês cosmopolita (1840-1900).

José Gerson da Cunha

CUNHA, José Gerson da (1844, Arporá, Goa – 1900, Bombaim), médico, historiador, coleccionador, numismata, viajante, orientalista.

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José Gerson da Cunha, 1878. Retrato fotográfico em formato carte-de-visite, Estúdio Fotográfico de Lorenzo Suscipj, Roma.

Gerson da Cunha, oriundo de uma família católica de origem brâmane, cursou medicina, primeiro em Bombaim (1862), e depois em Edimburgo e em Londres (1867) onde se especializou em obstetrícia.

Entre a medicina e a história, entre a profissão e a vocação, Gerson da Cunha tenderá cada vez mais para esta última e, a partir da década de 1870 enveredou consistentemente pela escrita e pela investigação, investindo nos seus interesses pela história, arqueologia, filologia, etnografia e numismática, muito embora continuasse a exercer medicina e interessar-se pelos desenvolvimentos científicos nesse domínio. Foi neste período que publicou então, entre outros, relatos de viagens: “Exposição Universal de Paris (Impressões e belezas). Fragmento da Minha Viagem pelo Egypto, França, Inglaterra e Escoçia” (1867); “Recordações da minha viagem pelo Egypto, França, Inglaterra e Escossia” (1873).

Um dos principais objectivos de Gerson da Cunha enquanto historiador, todavia, era o de escrever a história dos Portugueses na Índia através de uma abordagem multidisciplinar, servindo-se de fontes documentais, linguísticas e de cultura material, pertencentes a bibliotecas e arquivos geograficamente muito diversos. Enquanto colecionador, também fazia uso dos seus livros, manuscritos, objectos e moedas que foi acumulando ao longo da vida. Publicou sucessivamente: “An Historical and Archaeological Sketch of the Island of Angediva” (1875) e “Notes on the History and Antiquities of Chaul” (1876). Escreveu ainda sobre Baçaim, Notes on the History and Antiquities of Chaul and Bassein. Illustrated with Seventeen photographs, nine lithographic plates and a map e Bombaim, iniciando o seu labor com “Words and Places in and about Bombay” (1874) e que culminou com The Origins of Bombay (1900), publicado já postumamente. O interesse pela numismática, uma outra fonte histórica, levou-o a publicar “Contributions to the Study of Indo-Portuguese Numismatics (Part First and Part Second)” em 1880 e “Contributions to the Study of Indo-Portuguese Numismatics (Part 3rd), em 1883. O conjunto desses estudos foi traduzido em Português: Contribuições para o estudo da numismática indo-portuguesa. (1955)

Deu a conhecer os seus interesses orientalistas com “Contributions to the Study of Avestaic and Vedic Analogies” (1878), apresentada na prestigiada instituição Bombay Branch of the Royal Asiatic Society, mas a sua verdadeira estreia como Orientalista no âmbito internacional ocorreu por ocasião do IV Congresso Internacional dos Orientalistas (1878), em Florença, no qual apresentou uma contribuição sobre o estudo do Sânscrito e da cultura Hindu entre os Portugueses, publicado nas Actas do mesmo: “Materials for the History of Oriental Studies amongst the Portuguese” (1880). Participou ainda no XII Congresso Internacional dos Orientalistas (1889), em Roma.

No trabalho apresentado em Florença no Congresso de 1878, Gerson da Cunha questiona a ignorância generalizada, tanto em Portugal como no estrangeiro, do pioneirismo de Estudos Orientais praticados por Portugueses nos séculos XVI e XVII, que ele atribui ao desconhecimento da língua portuguesa na qual foram escritos esses primeiros contributos e ainda ao facto de serem praticados no meio eclesiástico com o intuito de missionação. Face à pujança de Estudos Orientais que presenciou na Índia Britânica, Gerson da Cunha atribuiu aquele Orientalismo português dos primórdios o papel fundador na genealogia de Estudos Orientais, da qual ele próprio se considerava um herdeiro.

A sua singularidade de Orientalista “oriental” manifestou-se duplamente pelo conhecimento de várias línguas indianas e europeias e pelo conhecimento de diferentes historiografias, o que contribuiu para o cosmopolitismo da sua produção intelectual, patente nos temas abordados, como por exemplo: Memoir of the History of the Tooth-Relic of Ceylon with a preliminary essay on the life and system of Gautama Buddha (1875 e, numa tradução em Francês, em 1885); The Konkani Language and Literature (1881).

Foi sócio de diversas agremiações científicas, entre elas, a Bombay Branch da Royal Asiatic Society of Bombay, onde chegou a ser vice-presidente, e a Anthropological Society of Bombay que lhe estava associada, ou a Zoological and Botanical Society of Vienna. Muito embora tivesse sido também membro da Sociedade de Geografia de Lisboa e da Academia das Ciências de Lisboa, as suas relações com Portugal parecem ter sido pouco mais do que honoríficas, contribuindo para a invisibilidade de Gerson da Cunha no contexto erudito português da época.

Da relação amistosa com o indianista italiano Angelo de Gubernatis resultou uma copiosa correspondência em Português, actualmente no acervo da secção de manuscritos da Biblioteca Nacional de Florença. É muito provável que Gerson da Cunha mantivesse contactos epistolares com vários outros orientalistas fazendo parte de uma rede global de homens que produziam conhecimento sobre a Índia. No entanto o facto de se desconhecer o paradeiro ou sequer a existência do seu arquivo pessoal faz com que apenas possamos conhecer as suas cartas existentes nos arquivos daqueles com quem se correspondeu, nomeadamente Angelo de Gubernatis e o antropólogo italiano Paolo de Mantegazza, existentes no arquivo do Museo de Antropologia, em Florença.

Foi casado com Ana Rita da Gama (1858-1921), filha de um ilustre médico de Goa, e teve três filhos: Olívia realizou estudos artísticos em Florença, enquanto Gilberto e Emelina estudaram e exerceram medicina como o pai.

FLV

Bibl.: CUSATI. (2000); MORAES, G. M. (1967), pp. 1-50; VICENTE, F. L. (2012 a), pp. 603-636; Idem (2012 b), pp. 133-151; Idem (2012 c), pp. 603-636; Idem (2010 a), pp. 128-136; Idem (2010 b), pp. 11-37; Idem (2010 c), pp. 27-46.

D. Pedro II

D. Pedro II (1825, Rio de Janeiro – 1891, Paris), D. Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga de Bragança.

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D. Pedro II, retrato de Delfim da Câmara, col.. Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro

O imperador D. Pedro II, que governou o Brasil de 1840 a 1889, era um orientalista. Ele dedicou boa parte de sua vida a estudar línguas orientais, como hebraico, árabe, turco e persa, até – literalmente – a véspera de sua morte, e a colecionar livros e fotografias ligados ao Oriente; correspondeu-se com famosos especialistas, como Ernest Renan e Maxime du Camp; e visitou a região por duas vezes, em 1871 e 1876. Acompanhava também com profundo interesse os Congressos Internacionais dos Orientalistas e, inclusive, participou do terceiro deles, realizado em São Petersburgo, na Rússia, em 1876.

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D. Pedro II na Sessão de Abertura do Terceiro Congresso Internacional dos Orientalistas, São Petersburgo, 1876. Col. George Ermakoff.

É de admitir que os seus interesses orientalistas devam-se, de certo modo, à sua mãe, D. Leopoldina, ou mais exactamente à sua biblioteca que D. Pedro herdou (BOJADSEN, 2006).

Ao se avaliar a vasta correspondência trocada entre o próprio Imperador e o conde de Gobineau, que serviu como ministro francês no Rio em 1870, já se percebe que o tema do Oriente se mostra onipresente. Gobineau quando de seu retorno à França comentou da reação dos orientalistas Ernest Renan e de Olivier Rougé à correspondência e lembranças enviadas por D. Pedro, por seu intermédio. Ao longo de cerca de onze anos, até a morte de Gobineau, em 1882, trocaram impressões sobre novas obras traduzidas – como o “Shahnameh”, de Julius Mohl -, sobre seus estudos de sânscrito e árabe, bem como sobre as obras publicadas por Gobineau nesse meio tempo, e descobertas arqueológicas orientais. Falam ainda das viagens de D. Pedro ao Oriente. Quando ainda organizava a primeira delas, ao Egito, em 1871, Gobineau lhe recomendava vivamente visitar a mesquita de Al-Azhar e que publicasse suas notas de viagens. Ambos trocaram ainda impressões sobre os egiptólogos Auguste Mariette e Henrich Brugsch, com quem D. Pedro se encontrou no Cairo (READERS, 1938, pp. 59-61). Foi justamente na companhia de Gobineau que D. Pedro II vistou Constantinopla (ocasião em que se encontrou com o Sultão Abdul Hamid II) e Bursa, em terras otomanas, no final de 1876.

Por fim, da Coleção Teresa Cristina, originária da coleção pessoal de D. Pedro II, actualmente sob guarda da Biblioteca Nacional no Rio de Janeiro, não só se percebe o verdadeiro diálogo do Imperador com sua coleção – escrevendo comentários nos versos das fotos ou nas margens dos livros -, como o quão atualizado se mostrava quanto as principais publicações e os debates correntes. Encontra-se ali a quase totalidade dos clássicos orientalistas da segunda metade do século XIX e boa parte das fotografias dos famosos fotógrafos do Oriente de então, como Félix Bonfils e Pascal Sébagh.

Em seus diários, publicados (FEINGOLD, 1999) e na forma de CD-Rom pelo Museu Imperial de Petrópolis (BEDIAGA, 1999), percebe-se que D. Pedro II, de fato, empenhara-se em adquirir fotografias e publicações, como também estudava seu material. Em novembro de 1871, por exemplo, comentava do encontro que tivera em Alexandria com Mohamed Bey, acadêmico árabe discípulo de François Arago, que lhe dera “diversas publicações suas entre as quais uma memória, onde ele quer que as pirâmides tivessem sido construídas em honra de Sothis (Sirius)”. Já em novembro de 1876, comenta da fotografia que ganhou do argelino Abd-el-Kader em troca da que havia lhe dado. E, ao visitar os colossos de Abu Simbel, no Egito, escreveu em seu caderno, impressionado: “os desenhos, as fotografias que havia visto não me proporcionavam uma ideia mesmo que longínqua do que havia experimentado assim que me aproximei daquele monumento”.

D. Pedro II foi tradutor do hebraico de “Piutim: Poésies hebraïco-provençales du rituel israélite comtadin” (Avignon, 1891). É lhe também atribuído o apoio à primeira tradução do Alcorão no Brasil (SIDARUS, 2000). Pesquisas recentes deram a conhecer o início do processo tradutório dos contos de Mil e Uma Noites, empreendido por D. Pedro II (KEMNITZ, 2015).

D. Pedro II representa um Orientalismo peculiar, que não envolvia o desejo de domínio político da região. Decorria de um interesse herdado do lado Habsburgo de sua família; de uma paixão incentivada pela profunda amizade que desenvolveu com o conde de Gobineau; e também de um esforço de acompanhar de perto, e a altura, a tendência intelectual europeia de seu tempo. É também provável que se interessasse pelos erros e acertos do Oriente por ver ali certa similaridade com dificuldades que o Brasil, um “império periférico” (SOCHACZEWSKI, 2012) enfrentava, como a questão da construção de estradas de ferro, que fez questão de inspecionar no Egito, e o desenvolvimento de instituições científicas e educacionais, que também visitou em Constantinopla. Mesmo ciente do interesse de populações do Médio Oriente de emigrarem para o Brasil, mesmo cristãos sobreviventes de massacres sofridos no Líbano e na Síria, como escreve textualmente em seu diário quando da visita a Damasco, nada de concreto fez para incentivá-los, ou para acolhê-los.

O Oriente para D. Pedro II era uma paixão, mas somente no âmbito intelectual.

M.S.

Bibl: BEDIAGA, B., org (1999); BOJADSEN, A. coord. (2006); BRAGANÇA, P. de (1891); FEINGOLD, R. (1999, passim); KEMNITZ, E-M. von (2015, no prelo), pp. 37 -59; LOEWENSTAMM, K. (s/d); READERS, G. (1938); SOUSA, R. de (2014), Tese de Mestrado; SIDARUS, A. (2000), pp 277-280; SOCHACZEWSKI, M. (2010),  pp. 73-91; Idem,(2012), Tese de Doutorado.

Isabel Murta Pina [I.M.P.]

Isabel Murta Pina é Doutorada em História pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (2009).  É investigadora no Centro Científico e Cultural de Macau (Lisboa). Docente no Instituto de Estudos Orientais da Universidade Católica Portuguesa (2006-2011) e na Licenciatura de Estudos Asiáticos na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (2011-2014). Tem trabalhado na área das relações interculturais entre a Europa e a China.

Álvaro Semedo

SEMEDO, Álvaro (1585, Nisa – 1658, Cantão), escritor e missionário jesuíta da Vice-Província da China

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Semedo retratado por Massimo Stanzione, Roma 1641

Admitido no noviciado da Companhia de Jesus, em Évora, no ano de 1602, Semedo já se encontrava em Macau, indigitado para a Missão da China, dez anos mais tarde, após uma breve estadia de cerca de três anos em Goa, onde concluiu o seu percurso académico e foi ordenado padre. Passou de Macau à China continental em 1613, com cerca de 28 anos, altura em que iniciou a aprendizagem da língua chinesa. Durante os 45 anos que se seguiram, Semedo foi acumulando conhecimento e experiência da China dos últimos anos da dinastia Ming (1368-1644) e primeiros da Qing (1644-1911). Ao estudo da língua, juntou a vivência em várias partes do país. Assim, acabou por se tornar, segundo escrevia por volta de 1640, praticamente “naturalizado”, já com dificuldades em recordar as suas origens, isto é, “natureza, língua, trajes e costumes”.

Semedo notabilizou-se no seu papel de procurador da missão da China à Europa, cargo que o levou a um afastamento daquele país, entre 1637 e 1645. Nesse espaço de tempo, o procurador visitou várias cidades europeias, de Évora, onde se tornara jesuíta, a Lisboa e Coimbra, em Portugal; mas igualmente Madrid, Bordéus, Londres ou Roma, entre outras. Nessa última cidade, Semedo foi retratado, envergando as suas vestes de seda, ao modo dos jesuítas da China, e segurando nas mãos um pincel e um livro com pretensos caracteres chineses. É precisamente neste contexto do seu périplo europeu que surge a obra que confere a Semedo um lugar de destaque entre os autores que, no século XVII, mais contribuíram para o desenvolvimento da imagem europeia da China. Com efeito, em 1642, saía pela primeira vez do prelo, em Madrid, o livro Imperio de la China y Cultura Evangelica en él. Composto em parceria com Manuel de Faria e Sousa (1590-1649), o seu editor, o livro surgiu em língua castelhana, de modo a alcançar uma audiência mais vasta. Rapidamente a obra foi traduzida e restruturada nos círculos jesuítas de Roma, dando origem a uma edição italiana, publicada logo em 1643, sob o título Relatione della grande monarchia della Cina. A partir desta última foram preparadas as edições seguintes, nomeadamente a francesa de 1645 (Histoire Universelle du Grand Royaume de la Chine, Paris) e a inglesa de 1655 (The History of that Great and Renowned Monarchy of China, Londres). Ao longo do século XVII, o livro foi, assim, publicado em quatro línguas diferentes, num total de pelo menos oito edições. Apenas em meados do século XX, esta obra foi editada em português, após a tradução da versão italiana, então empreendida por Luís Gonzaga Gomes (Relação da Grande Monarquia da China, Macau, 1956; reeditado 1994).

Embora este seja o mais extenso e influente contributo de Semedo, a sua produção textual sobre a China não se circunscreveu a ele, já que se conhecem cerca de trinta cartas e relatos deste jesuíta (redigidos entre 1618 e 1657), quase todos manuscritos, nos quais regista um conjunto de informação adicional sobre aquele país. Importa ainda sublinhar que lhe é atribuída a autoria de dois dicionários, um de Português-Chinês e outro de Chinês-Português.

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Folha de rosto da primeira edição de Imperio de la China y cultura evangelica en èl (Madrid, 1642), 360 pp.
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Folha de rosto da edição italiana, Relatione della Grande Monarchia della Cina (Roma, 1643), 309 pp.
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Folha de rosto da primeira edição portuguesa (Macau, 1956)

Semedo proporcionou um significativo manancial de notícias sobre a China, quer através das suas cartas e relatos, quer sobretudo através do seu livro. Neste último, Semedo dedicou à China Ming cerca de 200 páginas da edição castelhana (a que se acrescentam cerca de 160 sobre a actividade dos jesuítas na missão chinesa), nas quais procurou revelar uma imagem mais realista da China, expurgada das fantasias que afirmava persistirem sobre ela na Europa dos meados do século XVII.

De um modo geral, este livro surge em linha de continuidade com obras anteriores, tanto em termos de formato ou estrutura, como em muitos dos tópicos abordados. Semedo vai, no entanto, actualizar, corrigir e desenvolver um amplo leque de conhecimento, num texto que se caracteriza, pela sua clareza, rigor e narrativa atractiva, repleta de curiosidades e pequenas histórias destinadas a prender a atenção de um público europeu interessado no Oriente.

Uma imagem extremamente favorável da China e dos chineses, própria da produção europeia dos séculos XVI e XVII, ressalta no Imperio de la China (como no restante corpo documental de Semedo). De facto, aí vemos enaltecidos os habituais aspectos da grandeza territorial e demográfica da China, do seu desenvolvimento económico e comercial, ou da sua dimensão intelectual, com a associação entre o saber e o poder político e o respectivo estatuto sócio-económico, a par da difusão da imprensa e dos livros; mas igualmente se observa o elogio de outros aspectos menos comuns, como da arquitectura. Semedo contrabalança, porém, este registo favorável com críticas a elementos que julga menos positivos e que extravasam o domínio da religião e da superstição. Assim sucede no caso da imensidão de pobres contrastante com a riqueza geral do país, das artimanhas dos negociantes chineses, da prática feminina de enfaixamento dos pés, da ineficácia defensiva da Grande Muralha ou do desinteresse dos chineses pela arte e tecnologia da guerra que resultara na sua debilidade face à ofensiva manchu.

O contributo de Semedo para um melhor conhecimento da China é perfeitamente patente em tópicos como o da língua chinesa e da escrita, que desenvolve particularmente. É igualmente visível em questões como a do percurso de estudos e sistema de exames, em que do mesmo modo inova e pormenoriza relativamente a autores anteriores. No seu todo, a informação transmitida por Semedo, tanto de forma directa, como indirecta (pela integração ou reprodução em obras de outros autores), confere a este jesuíta português um lugar de destaque no âmbito do conhecimento europeu da China que se estava então a processar a um ritmo sem precedentes.

IMP

Bibl.: LACH, D. e KLEY, E. J. (1993); LÖWENDAHL, B. (2008), pp. 20-79; CHEN M.-S. (1978), pp. 20-79; MUNGELLO, D. E. (1985), pp. 76-90; PINA, I. Murta (no prelo); ROMANA, M. Salvado Pinto Pereira Barras (2003); ZHANG, M. (2007), pp. 132-140.

Duarte Drumond Braga [D.D.B.]

Duarte Drumond Braga é Doutor em Estudos Comparatistas pela Universidade de Lisboa (2014) e é atualmente pesquisador de Pós-Doutoramento em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa na Universidade de São Paulo: Pós-Doutoramento FAPESP (Proc. 2014/00829-8) Projeto Temático Pensando Goa, financiado pela FAPESP (Proc. 2014/15657-8). Trabalha sobre literatura portuguesa, Orientalismo português e literaturas de Goa, Macau e Timor.

Alberto Osório de Castro

CASTRO, Alberto Osório de (1868, Coimbra – 1946, Lisboa), juiz, poeta, tradutor, erudito, etnógrafo, arqueólogo e botânico.

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Fotografia do Autor

Viveu a maior parte da sua vida nas colónias portuguesas: em Goa (1894-1907), onde foi Procurador da Coroa e Fazenda e Juiz de Direito. Em 1907, foi juiz de direito da comarca de Moçâmedes (Angola). No mesmo ano pede transferência para Timor. Em 1911, está na relação de Luanda, de onde se transfere em definitivo para a Metrópole.

Na Metrópole, participou e presidiu a instituições relacionadas com assuntos coloniais: membro da Comissão de Defesa das Províncias Ultramarinas (1927), Vice-presidente da União Portuguesa do Ultramar (1928), presidente do Conselho Superior Judiciário das Colónias (1931). Foi jurado do VIIº Concurso de Literatura Colonial (1933) e júri do concurso literário do S.P.N. (1934) que premiou, em segundo lugar, Mensagem de Fernando Pessoa.

Em termos políticos, foi Ministro da Justiça num dos governos de Sidónio Pais, em 1918. Desempenhou outros cargos durante a Ditadura Militar. Foi um dos membros do Partido Centrista Republicano e presidente da Direção do Centro/Grémio Centrista de Lisboa. Pertenceu também à Maçonaria, tendo fundado, em 1911, a Loja Oceania em Díli.

Osório de Castro é uma figura a ser recuperada nos estudos do Orientalismo português, antes de mais a nível académico-científico. Em Goa fundou a longeva revista científica O Oriente Português, que começou em 1907, e dirigiu a biblioteca de Nova Goa. Embora amador, como vários intelectuais do seu tempo, foi um respeitado membro da comunidade científica nacional e internacional, o que comprovam as suas obras literárias, cheias de erudição orientalista, os estudos científicos éditos e inéditos no âmbito das ciências humanas e naturais, bem como vasta correspondência trocada com outros orientalistas seus contemporâneos, entre outros, com David Lopes, Guilherme de Vasconcellos Abreu ou Angelo de Gubernatis. Dados como estes permitem entender a razão pela qual Camilo Pessanha, em resenha a Flores de Coral (1910), lhe atribuía uma “pouco vulgar cultura científica”.

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O Oriente Portuguêz. V. 04 – N.º 04 Revista da Commissão Archeologica da India Portugueza, , 1907, 46 pags.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Mas o Orientalismo, em Alberto Osório de Castro, é ao mesmo tempo científico e estético, dimensões muito intimamente ligadas. Desde o seu primeiro livro, Exiladas (1895) se encontram poemas que glosam elementos da erudição orientalista, como o teatro clássico indiano ou motivos estéticos nipónicos. De outra forma, faz a poesia conviver com a erudição e a investigação cientifica em livros como A Cinza dos Mirtos (Nova Goa, Imprensa Nacional, 1906) e Flores de Coral (Díli, Imprensa Nacional, 1909) que (para além dos poemas) incluem pautas musicais, gravuras de antigualhas indo-portuguesas, glossários, boletins, documentos, visando contaminar a poesia pelo saber enciclopédico. Em volume, publicou ainda o livro de versos O Sinal da Sombra (Lisboa, Clássica Editora, 1923) e o relato em prosa A Ilha Verde e Vermelha de Timor (Lisboa, Agência Geral das Colónias, 1943). Em 2004, a Imprensa Nacional-Casa da Moeda reuniu em dois volumes a sua obra poética, com estudo introdutório de José Carlos Seabra Pereira.

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Capa da primeira edição de Flores de Coral (1909)

Num ambiente onde se cruzam diversas poéticas e estéticas (Decadentismo, Simbolismo, Parnasianismo, indícios de Modernismo), é um dos mais centrais criadores de um gosto moderno pelo “oriental” na poesia portuguesa da viragem do século, o que na prática lírica corresponde a geografias diversas: Índia, Pérsia, Egito, Insulíndia (Java e Timor), Japão e China. Um verdadeiro pan-orientalista, segundo a noção de Ian Hokenson em Japan, France, and East-West Aesthetics (2004).

Esta forte inscrição na produção literária do saber acerca do Oriente é de fato característica da obra de Osório de Castro, e constitui uma forma de tornar a poesia participativa na construção de um Orientalismo português. Segundo Braga (2014), a obra de Osório de Castro estrutura-se de acordo com um projeto global visando criar um moderno Orientalismo português intimamente ligado ao projeto colonial: ao mesmo tempo erudito-cientifico e estético-poético. Esta parece ser a grande originalidade deste autor esquecido, quer pelos manuais de literatura, quer pela ciência.

 

DDB

 

BIBLIOGRAFIA: BERNARDO (1971); BRAGA (2014); MARTINS (2008), p. 312; OLIVEIRA (1959); PEREIRA (2004); SILVEIRA (1968), p. 122; SOUSA (2010), pp. 285-326.

Helmi Muhammad Ibrahim Nasr

NASR, Helmi Muhammad Ibrahim (1922, Egito), professor, tradutor, membro do Conselho dos Sábios da Liga Islâmica Mundial.

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Helmi Nasr (2012) e nos anos 60. (Homenagem a Helmi Nasr, São Paulo, 2012)

O professor Helmi Muhammad Ibrahim Nasr, fundou há mais de meio século o curso de língua e literatura árabes da Universidade de São Paulo (USP/SP).

Concluídos os seus estudos universitários na França, Helmi Nasr, como ficou conhecido no Brasil, voltou ao Cairo e foi nomeado professor de tradução francesa na Faculdade de Línguas Estrangeiras da Universidade de ‘Ayn ash-Shams.

No início do ano de 1962, depois de uma viagem do então presidente do Brasil, Jânio Quadros, em visita a alguns líderes orientais da época, decidiu criar os “estudos orientais” no Brasil. Foi, então, que contactou a Universidade de São Paulo, que diante desta solicitação acabou por criar sete cursos e, dentre eles, o de Árabe.

Diante dessa demanda, a USP foi em busca de professores, obviamente contactando alguns países árabes. O então presidente do Egito, Gamal Abdel Nasser, em atenção ao presidente brasileiro Jânio Quadros, que acabara de conhecer, empenhou-se pessoalmente para que fosse designado um professor de Árabe para o Brasil, o que para surpresa de Helmi Nasr foi o indicado e nomeado para a função devido a proximidade do Francês, cadeira que lecionava na Universidade do Cairo, com o Português. E assim, um projeto que inicialmente seria para um ano, imediatamente virou dois anos, oito anos e, enfim, o professor permaneceu definitivamente no Brasil. No entanto, ao chegar ao país, recebeu também o convite para dirigir um jornal árabe, uma revista e outras atividades ligadas ao mundo e a cultura árabes.

Os dois primeiros anos foram árduos, pois trabalhava sozinho em sua missão. Participou de incontáveis projetos, entre eles a criação do curso de Pós-Graduação em Língua, Literatura e Cultura Árabe da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas – FFLCH – da USP/SP. Aposentou-se compulsoriamente em 1992, embora continuasse trabalhando, voluntariamente.

Diante de tantos feitos do professor Nasr, e além de ter feito a tradução para o Árabe do livro de Gilberto Freyre, Novo mundo nos trópicos, nos finais do ano de 1980 e início de 1990, orientou projetos importantes com autores e colaboradores (inclusive com o maior calígrafo árabe do mundo, Hassan Massoudy): a Revista de Estudos Árabes, a revista Collatio onde teve importantes parcerias internacionais e dez livros da coleção Oriente e Ocidente. Também realizou dois importantes trabalhos, o dicionário Árabe-Português e a tradução do Alcorão, livro Sagrado do Islão.

O dicionário Árabe-Português foi editado e lançado no ano 2000, pela Câmara de Comércio Árabe Brasileira – CCAB. O dicionário possui setenta mil palavras, distribuídas em quatrocentas páginas, resultado de cerca de dez anos de pesquisa. Os originais permaneceram guardados por trinta e dois anos antes da publicação.

O trabalho de tradução do Alcorão, ou melhor, do “sentido” do Alcorão, como o entendem os muçulmanos, por ser o livro sagrado indissociável da língua árabe, conta com muitas e precisas notas. Foram vinte e dois anos, entre a tradução e revisões realizadas pela Liga Islâmica Mundial, em Meca, na Arábia Saudita. Finalmente, foi publicado em 2005, diretamente pelo organismo oficial do Islão, “Complexo do Rei Fahd”. Mais de trinta mil exemplares foram distribuídos no Brasil, segundo dados contidos em Aida Hanania e Jean Lauand (2015: 42).

Em 2007, Helmi Muhammad Ibrahim Nasr tornou-se um dos vinte e um membros do “Conselho dos Sábios”, entidade máxima dos eruditos da Liga Islâmica Mundial, sediada em Meca (Arábia Saudita), cujos membros representam os muçulmanos do todo o mundo islâmico. Cabe a esse Conselho dos Sábios ainda o planeamento e os projetos para preservação do modo de vida islâmico bem como melhorar a situação cultural no mundo árabe.

Em 08 de Junho de 2015 o Centro de Estudos Medievais Oriente e Ocidente – CEMOrOc, da Universidade de São Paulo, lançou a obra, O diplomata da língua e cultura árabes – estudos em homenagem a Helmi Nasr, organizado pelos professores Aida Hanania e Jean Lauand, em homenagem ao Mestre que em pouco voltaria para sua terra natal. O livro mostra a sua trajetória e a sua contribuição com os estudos Árabes no Brasil.

V.L.M.M.

Bibl.: HANANIA, A.; LAUAND, J. orgs. (2015); HANANIA, A.; LAUAND, J. (2012), pp. 192-205.

Websites

http://www.anba.com.br/noticia/7424384/artes/professor-helmi-nasr-distribui-traducao-do-alcorao-em-sao-paulo/?indice=960 – Acesso: Novembro/2015.

http://hottopos.com/collat6/nasr.ht – Acesso: Novembro/2015.

http://www.usp.br/jorusp/arquivo/2007/jusp809/pag0405.htm – Acesso: Novembro/ 2015

Guilherme de Vasconcelos Abreu

ABREU, Guilherme de Vasconcelos (1842, Coimbra – 1907, Lisboa) é conhecido pelo seu permanente esforço em estabelecer em Portugal os Estudos Orientais nos mesmos moldes em que estes vinham sendo desenvolvidos nas nações europeias hegemónicas, bem como pela sua insistência em chamar a atenção das autoridades portuguesas para a eficácia desses estudos na administração das colónias do ultramar.

Filho de Guilhermina Cândida de Vasconcelos Abreu e de Vítor Madaíl Abreu, passou a infância em Coimbra, no Porto e no Rio de Janeiro, bacharelou-se em Matemática, tirando em seguida o curso de Engenharia Naval, área em que chegou a exercer funções, para além das de notário em Coimbra e Lisboa.

Dedicando-se paralelamente ao estudo de línguas, literaturas e religiões orientais, chegou a fundar em 1873 a Associação Promotora dos Estudos Orientais e Glóticos, cuja duração foi efémera.

Subsidiado pelo governo português, entre 1875 e 1877 estudou sânscrito, antropologia e egiptologia em França, Inglaterra e Alemanha com renomados professores (Abel Bergaigne, Martin Haug, Paul Broca, Gaston Maspero etc.).

Em 1877 foi nomeado lente do Curso Superior de Letras (actual Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa), assumindo aí a cadeira de Língua e Literatura Sânscrita que lhe fora especialmente criada.

Foi membro da Academia Real de Ciências de Lisboa, presidente da Secção Asiática da Sociedade de Geografia de Lisboa, condecorado em Portugal e no estrangeiro e sócio-correspondente de diversas sociedades científicas.

Entre os seus trabalhos publicados destacam-se: Exposição feita perante os membros da Commissão Nacional Portugueza do Congresso Internacional dos Orientalistas (1874), Questions védiques (1877), Investigações sobre o caracter da civilisação árya-hindu (1878), Principios elementares da grammatica da lingua Sãoskrita (1879), Passos dos Lusíadas : estudados à luz da mitolojia e do orientalismo  (1892), Manual para o estudo do sãoskrito clássico (1881), Summario das investigações em samscritologia : desde 1886 até 1891 (1891), A lenda dos Santos Barlaão e Josafate: memória apresentada à 2ª classe da Academia Real das Ciências (1898), Os Contos, Apólogos e Fábulas da Índia (1902).

Bibl.: “Dr. Vasconcellos-Abreu”(1907), obituário Diário de Notícias; SANTOS, F. M. Cardoso (2010), tese de mestrado / Universidade de Lisboa.

Veja-se ainda: https://vasconcelosabreu.bnportugal.gov.pt/apresentacao

E. M.